O inquérito policial reuniu 6 terabytes de material, produziu um relatório de 486 páginas e um total de 20 mil páginas de documentação
Quatro meses após a execução do corretor de imóveis Antônio Vinícius Gritzbach, alvejado a tiros em novembro de 2024 na área de desembarque do Aeroporto de Guarulhos, a Polícia Civil de São Paulo finalmente concluiu a investigação do crime. O inquérito, divulgado nesta sexta-feira (14), revela um enredo que envolve vingança, corrupção policial e disputas dentro da facção criminosa PCC.
A apuração confirma que Gritzbach foi morto como retaliação pela execução de Anselmo Becheli Santa Fausta, o “Cara Preta”, e seu motorista, Antônio Corona Neto, o “Sem Sangue”, em 2021. Ambos eram integrantes da alta cúpula do PCC, e a morte do corretor foi arquitetada como uma resposta do crime organizado.
Com a finalização do inquérito, seis pessoas tiveram prisão preventiva solicitada pela polícia, incluindo três policiais militares que, supostamente, foram pagos para executar o assassinato.
Crime
A investigação aponta que o cabo Denis Antonio Martins e o soldado Ruan Silva Rodrigues, ambos da Polícia Militar, foram os responsáveis pelos disparos que mataram Gritzbach. O tenente Fernando Genauro da Silva, lotado na 1ª Companhia do 23º Batalhão da PM, teria sido o motorista do veículo usado no crime.
Além dos PMs, a polícia também indiciou Carlos Gongorra Castilho, conhecido como “Cigarreira”, apontado como um dos mandantes do crime e amigo próximo de Cara Preta; Diego do Amaral Coelho, o “Didi”, que teria conflitos pessoais com a vítima; e Kauê Amaral Coelho, sobrinho de Diego e responsável por monitorar Gritzbach no aeroporto antes da execução.
Por enquanto, apenas os três policiais estão presos temporariamente, enquanto Kauê, por exemplo, já teria fugido para o Rio de Janeiro.
A participação dos policiais no crime escancara, mais uma vez, a simbiose entre forças de segurança e o crime organizado, em um esquema no qual agentes do Estado, ao invés de combaterem facções, atuam a serviço delas. Segundo a polícia, os PMs foram contratados por sua experiência tática e acesso a armamentos de alto calibre, além do conhecimento em investigação criminal, que lhes permitiu tentar encobrir rastros da execução.
Tribunal do Crime
O pano de fundo do assassinato de Gritzbach está ligado a um esquema milionário envolvendo criptomoedas e traições dentro da cúpula do PCC. O corretor de imóveis teria sido alvo da facção após supostamente sumir com US$ 100 milhões (R$ 547 milhões) que pertenciam a Cara Preta, dinheiro que deveria ter sido investido em criptomoedas.
A suspeita sobre o envolvimento do corretor no desvio dos valores levou a um “tribunal do crime” dentro do PCC, no qual Gritzbach teve que prestar contas. Curiosamente, ele sobreviveu a essa primeira sentença, conseguindo convencer os líderes da facção de sua inocência.
Castilho e Diego Amaral Coelho, segundo a polícia, foram os encarregados de contratar os PMs que executaram o corretor no aeroporto. Antes de morrer, Gritzbach chegou a acusar Castilho de ser o mentor de um esquema para incriminá-lo na morte de Cara Preta.
A rede de crimes não para por aí. Segundo as investigações, Castilho mantinha relações com traficantes do Comando Vermelho, que teriam ajudado na fuga de Kauê para o Rio de Janeiro, escondendo-o no Complexo da Penha.
Joias de R$ 1 milhão
Outro detalhe revelado pela investigação é que, no momento da execução, Gritzbach carregava consigo joias avaliadas em R$ 1 milhão, pertencentes ao empresário de bitcoins Pablo Henrique Borges. O corretor havia buscado os itens em Maceió pouco antes de ser morto.
Além dos conflitos com o PCC, Gritzbach também travava uma disputa judicial de R$ 4,4 milhões contra Borges, que, por sua vez, chegou a ser preso em 2022 como suspeito no assassinato de Cara Preta — embora essa hipótese tenha sido descartada pela polícia.
O inquérito policial reuniu 6 terabytes de material, produziu um relatório de 486 páginas e um total de 20 mil páginas de documentação.