Tião Maia, de Rio Branco (AC)
Especial para o Fatos Online
Promotores de Justiça do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Estado do Acre (MPAC) entraram na primeira quinzena de setembro atuando em investigação sigilosa sobre a chamada “Máfia dos Consignados”, que consiste na aplicação de golpes contra servidores púbicos e contra o sistema financeiro nacional. No Acre, os principais implicados no golpe, de acordo com as primeiras investigações, são os familiares do candidato a prefeito pela federação partidária formada pelo MDB/PT,PV/PCdoB, Marcus Alexandre, na Capital Rio Branco.
As primeiras investigações causaram a demissão da assessora jurídica do grupo especial de procuradores de Justiça do próprio MPAC, Rafaela Ferreira Maciel Médice de Aguiar, no último dia 30 de agosto. A mulher é esposa de Guilherme Alexandre Médice Aguiar Junior, filho do irmão mais velho de Marcus Alexandre, Guilherme Alexandre Médice Aguiar, funcionário do MDB, que pode ser encontrado diariamente no escritório de campanha do irmão, na Avenida Antônio da Rocha Viana, onde também funciona a sede estadual do MDB em Rio Branco.
As investigações apontam que, num único caso de irregularidades, a agora ex-assessora do MPAC Rafaela Ferreira Médice Aguiar embolsou pelo menos R$ 169 mil, mas não é o único caso. Rafaela, que vem a ser irmã do diretor-geral de Polícia Civil do Acre (PCCA), delegado Henrique Maciel, tem envolvimento em outras ocorrências do mesmo gênero, com outros envolvidos.
No caso em que ela recebeu os R$ 169 mil em sua conta, o dinheiro era relativo a 70% do valor de uma casa pertencente à família do contador Francisco Barbosa da Silva, localizado na quadra N6 do Conjunto Tucumã, em Rio Branco. O contador é mais uma vítima do grupo integrado pelo casal Médice Aguiar e mais um sócio de nome Eder Costa Martins, nas empresas de empréstimos consignados Ecom e 3G.
A casa foi dada em garantia do empréstimo junto ao Banco Santander. Pelo contrato, os R$ 169 mil seriam embolsados e divididos entre os sócios proprietários da empresa Ecom, pertencente a Eder Costa mas com a qual o casal Guiherme e Rafaela Médice Aguiar tem relações de negócios. A contrapartida contratual é que Francisco Barbosa, que precisava de empréstimo para saudar dívidas de pequeno porte, receberia num primeiro momento R$ 15 mil, mais R$ 5 mil mensais por dois anos, até o termino do contrato, em dezembro de 2024, e a empresa Ecom seria responsável pelo pagamento de R$ 3 mil mensais relativos ao valor do empréstimo junto ao banco.
“As duas ou três prestações do banco, ele até pagaram. Mas depois não pagaram mais nada, nem me passaram o dinheiro prometido, os R$ 15 mil e mais os R$ 5 mil por mês. Como o dinheiro liberado pelo banco foi parar na conta da dona Rafaela, fui falar com ela, porque a casa é da minha família e corre o risco de ir para leilão, conforme ameaçou o Banco Santander em seguidas ligações para meu telefone para avisar que as prestações dos empréstimos estavam atrasadas e que o empréstimo precisava ser quitado sob pena de o imóvel da minha família ser arrestado pelo banco”, disse o contador.
Segundo ele, ao procurar Rafaela, onde ela trabalhava, na sede das promotorias especiais do MPAC, chegou a ser ameaçado de prisão por importunação. Além de exercer cargo estratégico no MPAC, Rafaela Ferreira Médice Aguiar lembrou na époa à vítima que é irmã do diretor da Polícia Civil do Acre (PCCA). O delegado Henrique Xavier Ferreira Maciel também foi procurado por Francisco Barbosa para se queixar de que a irmã da autoridade policial participava da quadrilha que o havia enganado e que o estava inclusive ameaçando de prisão.
Para sua surpresa, o delegado nada fez. A primeira queixa prestada por Francisco Barbosa data de 19 de junho de 2023, e até agora nada foi feito sobre o caso mesmo 14 meses depois.
Ouvido pela reportagem, o delegado Henrique Maciel disse que não cabe a ele administrar ou interferir em inquéritos da Polícia Civil e que, no caso envolvendo sua irmã, orientou a vitima Francisco Barbosa a procurar a delegacia de origem do caso, a do Conjunto Tucumã. Na delegacia, Barbosa aproveitu ainda para denunciar que outro sócio de Guilherme Aguiar Médice Aguiar Júnior, de nome Gilson Targina, o ameaçou de morte dizendo que, caso ele insistisse nas cobranças, iria levar seis tiros na cara. Barbosa tem os áudios com a voz do ameaçador. Mesmo assim, os inquérito sobre os casos, sob responsabilidade da Polícia Civil, não andaram.
Envolvido nos crimes, empresário foi candidato a deputado federal e obteve apenas 55 votos
Francisco Barbosa diz que travou contato com os falsários através de sua profissão de contador ao prestar serviço para um empresário da área de dedetização de nome Jorge Henrique Mulato, que atua no Acre. Mistura de empresário e político, nas eleições de 2022 Jorge Henrique foi candidato a deputado federal pelo Podemos. Num universo de 588 mil eleitores, teve exatos 55 votos. O que faltou em votos, sobrou em esperteza, denunciou tempos depois o contador Francisco Barbosa.
O endividado contador queria quitar dívidas e então colocou à venda a casa de sua família, que ele administrava. Foi quando Jorge Henrique, aquele dos 55 votos para Câmara Federal, disse-o que tinha amigos que faziam com ele um negócio vantajoso em que Barbosa nem precisaria vender o imóvel. Bastaria aliená-lo ao banco sob o financiamento de 70% do valo total da casa, o que foi feito e agora o contador, além das dívidas anteriores, tem um novo empréstimo a pagar e entrou na Justiça, em junho de 2024, com uma ação assinada pelos advogados Walter Luiz Moreira Maia e Daniel da Cruz Gouveia, com uma ação de rescisão contratual com pedido de danos morais.
Apesar do pedido, até esta terça-feira 10/09, nenhum juiz das varas cíveis da comarca de Rio Branco não havia despachado o destino da ação em que Francisco Barbosa, por meio dos advogados, tenta desfazer o contrato em que o imóvel de sua família é a única garantia para quitar dívidas de um empréstimo do qual ele não se beneficiou.
Situação parecida vive uma policial civil do Acre que o MPAC pede para que sua identidade seja mantida em reserva a fim de não atrapalhar as investigações. O MPAC não permite sequer que sejam revelados os nomes dos promotores que atuam nas investigações conduzidas pelo Gaeco por temer represálias individuais contra seus membros face à periculosidade dos envolvidos nos crimes.
É a esses promotores que a policial civil vem depondo sob sigilo desde os primeiros dias desta semana. Localizada, a própria policial pede pela preservação de sua identidade mas admitiu os depoimentos ao Gaeco e algum conteúdo do que vem dizendo aos promotores. A policial contou que tinha uma dívida anterior junto ao Banco do Brasil quando as mesmas pessoas do caso do contador Francisco Barbosa, ela saberia depois, lhe ofereceram a possibilidade de renovar seu empréstimo.
Feitas negociações, com a portabilidade em aberto para conseguir um novo empréstimo, pegar dinheiro suficiente para quitar o anterior e ainda lhe sobrar algum dinheiro, ela acabou depositando mais de R$ 100 mil em contas as quais tinham acesso o casal Médice Aguiar e seus sócios. O dinheiro seria para quitar o empréstimo anterior e a policial civil se surpreendeu quando, três meses depois, apesar da devolução do dinheiro liberado no segundo empréstimo, ao invés de dever apenas um empréstimo, tinha a agora dois a pagar. E o dinheiro das transações havia sumido.
Fraudes foram cometidas até contra familiares na casa dos Alexandre Médice Aguiar
A Polícia Civil tem extratos de transferências bancárias, provas fornecidas por investigadores d polícia judiciári ao MPAC, dando conta de que parte do dinheiro liberado no segundo empréstimo, acabou indo parar na conta de Guilherme Alexandre Médice, o pai de Guilherme Júnior. As transferências foram feitas por uma mulher de nome Heloise Andrade Almeida, fisioterapeuta lotada no hospital da Fundação Hospitalar do Acre (Fundhacre), que se apresenta como Heloise Serafim e tem conta na agência 1279 do Banco do Brasil, no município de Sena Madureira, onde seu tio, Mazinho Serafim (Podemos), é o prefeito.
Foram duas transferências, em valores que chegam a R$ 35 mil de Heloise para a conta de Guilherme Alexandre, o irmão mis velho de Marcus Alexandre, o ex-prefeito de Rio Branco entre 2012 a 2018 pelo PT e candidato a voltar ao cargo pelo MDB em 2024.
Além da Policial Civil do Acre, há, entre as vitimas, um major aposentado da Polícia Militar do Acre e vários outros servidores públicos. Mas há também informações de que os golpes da quadrilha foram aplicados dentro da casa da própria família.
O caso ocorreu envolvendo dona Sebastiana Correa, uma senhora de 65 anos, residente na cidade Pratápolis, interior de Minas Gerais. Irmã de dona Celia Médice Aguiar, mulher de Guilherme Alexandre e mãe de Guilherme Júnior, dona Sebastiana resolveu deixar, em junho do ano passado, a tranquilidade da vida no interior de Minas e atravessar o pais até a Amazônia, para passar uns dias de férias com a família em Rio Branco, no Acre.
Hóspede na casa do cunhado, no Portal da Amazônia, bairro nobre da capital acreana, e sob os paparicos da irmã Celia, dona Sebastiana recebia também com frequência a visita do sobrinho Guilherme Júnior e da esposa deste, Rafaela. O que pareciam manifestações carinhosas de uma família unida, eram apenas parte de um plano urdido não se sabe ao certo se por Guilherme Alexandre pai ou Guilherme Junior, o fato é que, ao voltar para Minas Gerais, com a ajuda da filha Rafaelli Correa, dona Sebastiana ficou sabendo que era devedora de um empréstimo de 84 prestações em valores superiores a R$ 900 por mês, um total de quase R$ 90 mil.
Só que, em depoimento à Polícia Civil de Minas Gerais, dona Sebstiana disse que jamais fizera o empréstimo dutante o período em que esteve no Acre. No máxima, emprestara seu telefone para os familiares fazerem pequenas compras, cmo medicamentos e edidos de pizzas.. Na investigação, a Polícia mineira descobriu que o endereço fornecido ao banco para a operação de empréstimo ser realizada era o mesmo da família Médice Aguiar em Rio Branco, onde ela ficara hospedada. Logo, a anciã deduziu que os falsários eram seus próprios parentes e botou a boca no mundo e que seu telefone fora usado durate aquelas pequenas operações de compras.
Em dezembro de 2023, todos os Médice Aguiar que vivem em Rio Branco, a exceção do candidato Marcus Alexandre, tiveram que ir à Policia Civil depor a respeito de uma carta precatória da Polícia de Minas Gerais com as acusações de dona Sebastiana sobre s fraudes que sofreu da própria família. Ao deporem, os Médice Aguiar tentaram na usar a polícia inverter, o que se diz em Direito, o ônus da prova – ou seja, seria dona Sebastiana a culpada pelo empréstimo, já que, segundo eles, teria sido ela que oferecera o dinheiro ao sobrinho Guilherme Júnior. “Mas ele está pagando tudo direitinho”, disse Guilherme pai, ao depor na Delegacia de Flagrate de Rio Branco.
“Tio, tamo junto”, diz Guilherminho em vídeo de campanha para Marcus Alexandre
Um investigador da Polícia Civil que atua no caso e que fez chegar o escândalo ao conhecimento do MPAC, que pede reservas quanto à própria identidade, não tem dúvidas de que parte dos recursos que abastecem a campanha de Marcus Alexandre está saindo dessas irregularidades. “Basta se quebrar o sigilo bancário do irmão Guiherme Alexandre que vai se encontrar dinheiro saindo das contas dele para Marcus Alexandre e sua campanha”, dez o policial, provocando os promotores do MPAC .
Mais que isso: ainda que não tenha recebido dinheiro irregular, o candidato do MDB não pode dizer que não sabia dos crimes praticados por seus familiares, que o assessoram junto ao comitê eleitoral. No caso do contador Francisco Barbosa e da Polícia Civil, que agora é testemunha do MPAC, Marcus Alexandre foi informado das irregularidades através do assessor Ney Melo, que foi avisado e comunicou o caso ao candidato. “Ele fez ouvido de mercador”, revelou Barbosa.
De tão íntimo com o irmão e o sobrinho, Marcus Alexandre, no primeiro programa de TV do horário político eleitoral, aparece ao ado do irmão e do sobrinho, além da mãe, pedindo licença aos familiares para, mais uma vez, afastar-se da família para poder ser candidato a prefeito. No vídeo, Guilherminho elogiou o tio pelo carinho, companheirismo e conclui com uma frase muito usada no meio da juventude que hoje sua cumplicidade:
“Estamos Juntos”.
A diretoria de comunicação do MPAC informou que o procurador-geral Danilo Lovisaro, que exonerou a servidora Rafaela Medice Aguiar de cargo estratégico na instituição, não fala sobre o assunto. “A investigação ocorre em sigilo. Então, no momento, o MPAC não vai se manifestar”, disse a comunicação da instituição.