Foram registradas seis mortes de crianças desde abril; famílias alegam negligência médica
A Saúde do Distrito Federal contabilizou mais uma perda irreparável: a morte de mais uma criança — a sexta desde abril. O caso aconteceu no Hospital de Ceilândia. Ayla, uma bebê prematura de apenas 11 dias, veio a óbito pouco tempo depois de receber alta hospitalar. A pequena, que nasceu com 35 semanas de gestação, necessitou de cuidados intensivos desde o momento do nascimento, incluindo assistência com oxigênio. As denúncias de negligência médica ocorrem diante de problemas estruturais na formação do sistema de Saúde do Distrito Federal, que lida com a escassez de profissionais e a falta de comprometimento dos gestores.
O drama começou quando Ayla foi liberada pelos médicos com apenas dois dias de vida. Segundo relatos, a equipe médica considerou a condição da bebê satisfatória para deixar o hospital, mas a família logo enfrentou complicações. No segundo dia em casa, Ayla começou a apresentar sérios problemas respiratórios e foi rapidamente levada de volta ao hospital. A família aponta que houve negligência por parte por parte da equipe que concedeu a alta hospitalar. A médica que recebeu a recém-nascida, quando a família retornou à unidade, apontou que a bebê deveria ter ficado internada. Com isso, ela foi encaminhada à Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Enquanto a filha estava internada, a mãe, uma adolescente de 16 anos, começou a sentir fortes dores abdominais em casa. Ao retornar ao hospital de Ceilândia, foi recomendado que ela realizasse uma ecografia em outro local, devido a problemas técnicos com o equipamento médico do hospital.
Após consultar uma clínica particular, descobriu-se que havia restos de placenta retidos no útero da jovem. A ocorrência pode levar a complicações graves como hemorragias e infecções uterinas.
A mãe da recém-nascida acredita que houve falhas graves por parte do hospital de Ceilândia. Devido a isso, os familiares registraram um boletim de ocorrência.
O caso também é investigado pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal, conforme declarou o próprio órgão.
Entre abril e maio deste ano, a rede pública de saúde do Distrito Federal registrou a morte de cinco crianças, gerando indignação e pedidos por investigação. Os casos incluem Enzo Gabriel, Jasminy, Anna Júlia, Aurora e Ingrid, cujas mortes foram atribuídas a falhas no atendimento.
Após denúncias de negligência por parte das famílias, deputados distritais propuseram a abertura de uma CPI da Saúde na Câmara Legislativa do DF (CLDF). No entanto, em uma reunião recente de líderes, a decisão foi tomada de não priorizar a instalação da CPI, que agora aguarda sua vez na fila de comissões de inquérito.
CPI do Iges-DF
Os deputados da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) apresentaram um requerimento para instituir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar o Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do Distrito Federal (Iges-DF). Os responsáveis pela iniciativa foram Fábio Felix (Psol), Gabriel Magno (PT), Max Maciel (Psol) e Dayse Amarilio (PSB). Posteriormente, a abertura da CPI obteve o apoio de mais quatro distritais, totalizando oito parlamentares, o mínimo necessário para a instauração. No entanto, as investigações não devem começar tão cedo. Isso porque, além de existirem outras três CPIs à frente, ainda ficou definido pela maioria dos parlamentares, durante decisão do Colégio de Líderes no dia 4 de junho, que a CPI da Saúde ficaria para depois.
No documento que fundamenta a criação da CPI, os parlamentares destacam que “é amplamente reconhecido pela sociedade do Distrito Federal que o sistema de saúde pública enfrenta uma série de desafios críticos, resultando em sérios prejuízos no atendimento à população”.
O deputado Fábio Félix, potencial relator da CPI, criticou a falta de respostas claras da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES) frente às acusações de negligência, o que, segundo ele, agrava ainda mais a crise na saúde pública. “Existe uma postura arrogante do governador do DF em não reconhecer a crise”, avaliou o parlamentar. Félix também lamentou a falta de diálogo do governo com a população e os profissionais de saúde, citando as longas filas nos serviços de saúde e a deficiência de infraestrutura.
Mesmo com as oito assinaturas requeridas para iniciar a investigação, a instalação da CPI não é garantida. O obstáculo reside nos pedidos anteriores que ocupam prioridade na fila de tramitação. Atualmente, existem três requisições anteriores pendentes (veja mais detalhes abaixo). Para que a CPI da Saúde seja efetivamente instituída, seria necessário dar prioridade a essas investigações ou obter o apoio de um total de 13 parlamentares, o que equivale à metade mais um do número total de deputados distritais.
Confira abaixo as CPIs que aguardam instalação na CLDF:
28/02/2023: requer criação de CPI para investigar fraudes na arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no DF;
29/08/2023: requer criação de CPI para investigar a poluição do Rio Melchior, que faz a divisão geográfica entre Ceilândia e Samambaia;
12/12/2023: requer criação de CPI para investigar a prática de crimes de violência contra as mulheres e os casos de assédio sexual no DF.
Nepotismo
Recentes eventos na gestão da saúde pública do Distrito Federal têm gerado controvérsias e críticas. Como foi apontado pelo Fatos Online, Lucilene Florêncio, ao assumir como secretária de Saúde, priorizou a melhoria da posição do filho, Felipe Florêncio Freire, no processo seletivo para o Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do DF (IGES-DF). Isso resultou na promoção de Felipe, que passou da 65ª para a 52ª posição durante a seleção, garantindo-lhe uma vaga na instituição. Caso não tivesse sido beneficiado, teria sido eliminado do processo.
Após ingressar como médico na UPA de Ceilândia, Felipe foi rapidamente promovido para chefiar a Coordenação de Assistência Pré-Hospitalar, elevando seu salário de R$ 12.181,25 para R$ 20.302,08.
Um mês após essa promoção, Lucilene, como presidente do Conselho de Administração do IGES-DF, aprovou a Resolução Nº 07, de 27 de setembro de 2023, que proíbe o nepotismo no instituto.
As ações da titular da Saúde do DF têm provocado um debate sobre a ética e transparência na administração pública, especialmente no que diz respeito ao princípio de igualdade de oportunidades e mérito nos concursos públicos.