Alvo das investigações foram manifestantes que insultaram ministros em Nova York, em 2022; uso informal de relatórios do TSE levanta questionamentos sobre legalidade
O ministro Alexandre de Moraes, do STF, utilizou o órgão de combate à desinformação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para produzir relatórios e reunir informações sobre manifestantes que insultaram ministros do Supremo durante um evento privado em Nova York, em novembro de 2022. Embora o episódio tenha ocorrido fora do período eleitoral, o órgão eleitoral foi utilizado para investigar os envolvidos.
As mensagens entre os gabinetes de Moraes no STF e no TSE foram divulgadas pelo jornal Folha de S. Paulo. De acordo com a reportagem, o gabinete de Moraes no STF solicitou de maneira informal a produção de relatórios pelo TSE para fundamentar decisões contra apoiadores de Bolsonaro no inquérito das fake news em 2022. A informalidade gerou preocupação entre os assessores do ministro, que temiam a exposição de práticas não oficiais. Um dos assessores, em áudios, destacou que a situação poderia parecer “muito descarada” se questionada formalmente.
Caso de Nova York
O uso da estrutura de combate à desinformação do TSE contra manifestantes em Nova York começou antes mesmo da chegada de Moraes aos EUA. Após publicações nas redes sociais sobre o evento, o ministro acionou o juiz Marco Antônio Vargas, que estava no gabinete da presidência do TSE, para que Eduardo Tagliaferro, chefe da AEED (Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação), monitorasse as redes e produzisse um relatório sobre as ameaças.
Durante os dias 14 e 15 de novembro de 2022, logo após o segundo turno das eleições, Moraes e outros ministros do STF, como Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso, participaram do Lide Brazil Conference, organizado pela família de João Doria. Na ocasião, um grupo de bolsonaristas assediaram e insultaram os ministros em locais públicos, como restaurantes e hotéis, e o ex-presidente Michel Temer também foi alvo de xingamentos, conforme vídeos que circularam nas redes sociais.
Alvos específicos
As mensagens indicam que Moraes e seus assessores escolheram alvos específicos, como a deputada Carla Zambelli e o blogueiro Allan dos Santos, para serem monitorados. As ações resultaram em tensões entre o gabinete de Moraes, a Interpol e o governo dos EUA, devido à participação de Allan dos Santos nas manifestações.
Além disso, as mensagens trocadas entre os assessores de Moraes revelam uma preocupação com a legalidade das ações informais, que incluíam a identificação de manifestantes e a produção de relatórios para embasar futuras ações do STF. Em um dos diálogos, Tagliaferro questionou a fundamentação legal para utilizar o TSE em monitoramentos não relacionados a eleições, e a resposta foi que Moraes havia decidido agir pelo STF.
Em resposta às acusações de uso indevido do TSE, o gabinete de Moraes afirmou que “todos os procedimentos foram oficiais, regulares e devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com a participação integral da Procuradoria-Geral da República.”
Denúncias não vão para frente
Especialistas discutem a legalidade das ações e ressaltam que a informalidade na troca de informações pode abrir brechas para a contestação de provas, especialmente se as solicitações feitas via WhatsApp não tiverem sido formalizadas nos processos. Contudo, eventuais recursos seriam analisados pelo próprio STF, que já manifestou apoio a Moraes.