Apenas no Rio Grande do Sul, 43 cidades enfrentarão essa situação; no Brasil, o número de municípios com apenas um candidato dobrou desde o último pleito
Um fenômeno inusitado e crescente chama a atenção em várias partes do Brasil: o aumento de cidades com candidaturas únicas para o cargo de prefeito. Em meio a desafios como desastres naturais e a reconstrução de comunidades devastadas pelas enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul, 43 municípios do estado enfrentarão uma disputa eleitoral sem concorrência em 2024.
Um dos municípios que contará com apenas uma candidata é Santa Tereza. Em abril deste ano, a cidade, de 1.500 habitantes, foi uma das primeiras a sofrer as consequências da tragédia climática que atingiu o Rio Grande do Sul. Na ocasião, uma ponte foi destruída pela correnteza durante uma transmissão ao vivo da prefeita Gisele Caumo (PP), que agora é a única candidata às eleições para a prefeitura da cidade.
Em meio a enchentes que devastaram várias cidades, o Rio Grande do Sul se destaca como o estado com o maior número de municípios com apenas um candidato à prefeitura nas eleições de outubro.
O fenômeno de candidaturas únicas se repete em 214 municípios em todo o Brasil, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O número dobrou em relação a 2020, quando 107 cidades tiveram apenas um candidato concorrendo ao Executivo municipal. A legislação eleitoral estabelece que o candidato será eleito ao obter a maioria dos votos válidos, excluídos os votos em branco e nulos. Dessa forma, em caso de candidatura única, basta um único voto para confirmar a vitória.
Enquanto Santa Tereza se concentra na reconstrução, a cidade enfrenta um cenário diferente do vivido em 2020, quando Gisele Caumo foi eleita por uma diferença de apenas 19 votos. Embora a campanha tenha começado oficialmente na sexta-feira (16), o clima eleitoral quase não se faz presente no cotidiano da cidade. O principal partido de oposição, o MDB, optou por lançar apenas candidatos a vereador, facilitando a reeleição da prefeita. Desde setembro de 2023, Santa Tereza sofreu com cinco eventos climáticos extremos, resultando em danos estimados em cerca de R$ 100 milhões.
Essa situação em Santa Tereza reflete o que acontece em outras cidades da região atingidas pelas enchentes do rio Caí. Em Harmonia, Tupandi, Feliz, Alto Feliz e São Pedro da Serra, todas na mesma região, haverá chapa única na disputa pelas prefeituras. “Nem parece que há eleição, de tão tranquilo. Às vezes, as pessoas se surpreendem que estamos fazendo visitas, mesmo sem precisar”, comenta Ernani Forneck (União Brasil), prefeito de Harmonia, que também concorre à reeleição sem adversários. Ele já havia sido candidato único em 2020 e prevê uma eleição “sem muita disputa” nas cidades vizinhas.
A situação é semelhante em Vera Cruz, a maior cidade do Rio Grande do Sul com candidatura única. O prefeito Gilson Becker (PSB) busca a reeleição com uma ampla aliança, incluindo antigos rivais do PL e do PP, após ter sido eleito em 2020 com 45% dos votos válidos em uma disputa com outros três candidatos.
Outros estados
Minas Gerais é o segundo estado com mais candidaturas únicas, com 41 dos seus 853 municípios nessa situação. Em Nova Era, a 140 km de Belo Horizonte, o prefeito Txai Silva Costa (Rede) está a caminho de uma reeleição tranquila, após enfrentar quatro adversários em 2020. Pela primeira vez na história da cidade, haverá apenas um candidato concorrendo à prefeitura, fato comemorado por Costa em suas redes sociais: “Estou honrado em ser o primeiro candidato único a prefeito em mais de 300 anos de história de Nova Era, um sinal da aprovação massiva do nosso primeiro mandato”.
Já no estado de São Paulo, 26 cidades terão apenas um candidato a prefeito. A maior delas é Batatais, um município de 58,4 mil habitantes próximo a Ribeirão Preto. O prefeito Juninho Gaspar (PP) concorre à reeleição com o apoio de 12 partidos, incluindo o PT e o PL. Porém, Batatais é uma exceção, já que a maioria das cidades com candidatura única no Brasil tem menos de 5.000 eleitores.
Um exemplo é Avaí, no centro-oeste paulista, cidade com a maior porcentagem de população indígena em São Paulo. Lá, a prefeita Hellen Rodrigues (PSDB) concorre à reeleição sem adversários, seguindo os passos de seu pai, que foi prefeito de 2005 a 2012. Cidades com entre 5.000 e 10 mil eleitores representam 26% dos municípios com apenas um candidato à prefeitura.
Ariranha, no interior de São Paulo, é outra dessas cidades. Dede Trovó (PSDB), que foi derrotado em 2020 em uma disputa com outros três candidatos, agora enfrenta as urnas sozinho. Em Goiás, 20 cidades terão apenas um candidato à prefeitura, representando 8% dos municípios do estado. Em oito dessas cidades, os candidatos são filiados ao União Brasil, partido do governador Ronaldo Caiado. Logo atrás, o Paraná tem 18 cidades nessa situação, enquanto Pernambuco conta com duas cidades com apenas um candidato a prefeito. Entre elas, está Solidão, onde Mayco da Farmácia (PSB) faz uma campanha solitária.
Dos 214 candidatos que concorrem sozinhos nesta eleição, 81% buscam a reeleição. A maioria deles é composta por homens (89%), brancos (74%), casados (72%) e com nível superior completo (57%). O MDB lidera entre os partidos, com 23% desses candidatos, seguido pelo PSD (16%) e PP (13%). O prazo final para o registro de candidaturas terminou na última quinta-feira (15). A análise considera dados do TSE atualizados até as 19h30 da segunda-feira (19), incluindo as inscrições feitas presencialmente.